Raízes (PHONODISC 79186) - (1980) - Pedro Bento e Zé Da Estrada

Rosa Traiçoeira
Quem escuta não se esquece desta estória tão sentida
Sou um coração que vive triste e que padece
Ai meu Deus quem reconhece como é triste a minha vida

Tenho chorado com meu coração magoado
Só por causa de um passado cheio de felicidade
Este passado foi se embora e não voltou
Pra mim ele só deixou triste dor de uma saudade

Felicidade é uma morena faceira
Que foi minha companheira a quem dei meu coração
Era uma linda morena dos olhos pretos
Seu olhar era morteiro natural lá do sertão

O meu amor cada vez era mais forte
Não pensava na má sorte da cruel desilusão
Rosa traiçoeira foi se embora e não voltou
Meu rancho ela abandonou sem motivo e sem razão

Eu comparo esta minha sorte ingrata
Com a rosa lá da mata que a natureza criou
Mais o destino desfolhou minha ilusão
E a rosa pelo chão o vento cruel levou

Eu sou o cravo que fiquei aqui sozinho
Solitário num cantinho de tristeza já murchou
Estou cumprindo o que manda a minha sorte
Agora só espero a morte pra acalmar a minha dor

Mineira De Uberaba
Hoje eu lembro com saudade do meu tempo de solteiro
Fui buscar uma boiada no grande estado mineiro
Eu cheguei em Pouso Alegre dia três de fevereiro
Lá eu vi uma morena perdição de um boiadeiro

Ele disse que é mineira e nasceu em Uberaba
Se criou no campo afora lidando nas invernadas
Ela monta em burro bravo alegre dando risada
Pra pegar mestiço arisco nunca perdeu a laçada

Eu fui buscar uma vacada e o povo se admirou
Escapou uma vaca preta e a mineira acompanhou
A laçada bem certa, mas o laço arrebentou
Ela pegou a vaca a unha e sozinha derrubou

Eu convidei a morena pra ser minha companheira
Ela então me respondeu vivo muito bem solteira
Por dinheiro eu não me vendo eu também sou fazendeira
Se eu trabalho pra mostrar o valor de uma mineira

Ela fez a despedida foi numa segunda feira
Despediu e foi se embora numa besta marchadeira
Eu fiquei com a saudade da morena boiadeira
Nunca mais eu pude ver aquela linda mineira

Preto De Alma Branca
Fazenda da Liberdade quando o coronel vivia
Seus colonos e empregados gozavam da regalia
Mas tudo que é bom se acaba, cada coisa tem seu dia
Foi em uma tarde de maio o coronel falecia
Um preto velho chorou na hora que o caixão saía
Era o peão mais antigo que na fazenda existia

Com a morte do coronel seu filho ficou patrão
Mas não herdou do seu pai aquele bom coração
Mandou chamar o preto velho e falou sem compaixão
Vou mandar você embora não tenho mais precisão
Preciso aqui gente nova pra tratar da criação
Foi mais um golpe doído na vida desse cristão, ai

No palanque da mangueira o preto velho encostou
Ali de cabeça baixa seu passado relembrou
De quantos bois cuiabanos nos seus braços já berrou
Quantos potros redomão sua chilena quebrou
Um estalo no portão de repente ele escutou
Um pantaneiro furioso na mangueira penetrou, ai

A filha do fazendeiro, sua prendinha querida
Aquele anjo inocente brincava muito entretida
O preto saiu correndo com suas pernas enfraquecidas
Parou na frente do boi quando ele deu a investida
No chifre do pantaneiro suas forças foi vencida
Pra salvar a sinhazinha ele arriscou sua própria vida

O fazendeiro correndo cinco tiros disparou
Derrubou o pantaneiro, mas nada disso adiantou
Abraçando o preto velho o coitado ainda falou
Mande benzer a sinhazinha do susto que ela levou
Eu preciso ir-me embora minha hora já chegou
E o preto de alma branca deste mundo descansou

Falsidade
Quem lutar com sua vida tem direito de vencer
O sol nasceu para todos e Deus para proteger
Jesus quando andou no mundo o que disse não foi a esmo
Quem faz o mal para outro, está fazendo para si mesmo

Eu trago sempre um ditado que nunca será esquecido
Diz que quem com ferro fere, com ferro será ferido
Está escrito na Bíblia os mandamentos sagrados
Pois quem erra neste mundo aqui mesmo é castigado

Eu conformo com o sucesso e também com fracasso
Se eu tenho uma boa idéia aproveitam o que faço
Ajo com boa maneira e recebendo a traição
A justiça nunca falha cumpre com suas próprias mãos

Neste mundo de meu Deus há castigo pra toda gente
Paga os que têm culpa, também paga os inocentes
O Judas traiu Jesus perdeu para eternidade
Pois também será perdido quem pratica falsidade
Pois também será perdido quem pratica falsidade

João De Barro
Um João de Barro pra ser feliz como eu
Certo dia resolveu arranjar uma companheira
Num vai e vem com o barro na biquinha
Ele fez sua casinha lá no galho da paineira

Toda manhã o pedreiro da floresta
Cantava fazendo festa pra aquela que tanto amava
Mas quando ele ia buscar um raminho
Para construir seu ninho o seu amor lhe enganava

Mas neste mundo o mal feito é descoberto
João de Barro viu de perto sua esperança perdida
Cego de dor trancou a porta da morada
Deixando lá sua amada presa pro resto da vida

Que semelhança entre o nosso fadário
Só que eu fiz o contrário do que o João de Barro fez
Nosso Senhor me deu calma nesta hora
A ingrata eu pus pra fora aonde anda eu não sei

Triste Romance
Na fazenda da tapera há muitos anos passados
Aconteceu um caso triste que deixou o povo abismado
Uma família morava num ranchinho barroteado
Quase na furna da serra, sem vizinho, retirado,
Tiveram um triste destino, ai, como alguém que é castigado

A mulher foi lavar roupa bem longe no ribeirão
E deixou as três crianças no ranchinho beira chão
Por ter amor em seus filhos, sempre prestava atenção
De deixar os três sozinhos se esquentando no fogão
De repente ouviu um grito, ai, que implorava salvação

A mulher saiu correndo naquela triste aflição
Quando chegou no ranchinho comoveu seu coração
O rancho estava queimando sem poder mais por as mãos
As criancinhas gritavam de baixo de um cinzerão
Os três morreram queimados, ai, na mais triste judiação

Acabou de queimar a casa, só restou um brazeirão
Chegou o pai das crianças fazendo reclamação
Chorando ele procurava seus filhos coração
Encontrou só três toquinhos pretos que nem um carvão
Queimou que acabou em nada, coube só em um caixão

Os anjinhos no outro dia saiu pra ser enterrado
O sino da igrejinha batia descompassado
O pai e mãe chorando sobre o caixão enfeitado
Reclamando a triste sorte, gritando desesperados
Esse romance tristonho foi por Deus determinado

Boiada
Boiada triste, boiada na estrada cheia de pó
Boiada o meu coração também caminha tão só
Levando junto a saudade velha esperança guardada
Vai carregando a tristeza a passo lento na estrada

Saí de casa menino deixei chorando meus pais
Cresci no mundo sozinho e não voltei nunca mais
A irmã deve estar casada, a mãe que nunca me esquece
Meu pai de certo está velho, o irmão já nem me conhece

A lua me beija o rosto sereno me faz carinho
O vento faz serenata aonde eu durmo sozinho
As estrelas são meus guardas posso dormir sossegado
E quando elas vão-se embora o sol vem juntar meu gado

Muitas vezes na despedida eu tenho que disfarçar
Quando uma lágrima rola caindo do meu olhar
A poeira vai levantando no céu formando um letreiro
Se espalhar em letra de pó lembrança de um boiadeiro

Resposta
Ai, um dia desses passos, ai, um carta eu recebi
Ai, a pessoa que escreveu
O endereço não me deu por isso eu não respondi
Ai, mais eu fiquei desconfiado
Que é um violeiro mal criado, sou capaz de garantir

Ai, que é um violeiro mal criado, ai sou capaz de garantir
Ai, na carta ele me xingou
De medo não assinou a letra eu não conheci
Ai, do jeito que eu interpreto
Ele é um analfabeto e agora tem que me ouvir

Ai, ele é um analfabeto, ai, agora tem que me ouvir
Ai, por que não sou assassino
Quando eu escrevo eu assino, estudei e aprendi
Ai, seja cedo ou mais tarde
O nome desse covarde ainda eu quero descobrir

Ai, o nome desse covarde, ai ainda eu quero descobrir
Ai, fique ciente que eu não brigo
Se quiser cantar comigo apareça por aqui
Ai, que eu sou cantador educado
E a peteca do meu lado ainda não deixei cair

Ai, violeiro sem educação
Que dá o tapa e esconde a mão, não vai dizer que eu corri
Ai, terminando agora eu digo
Me desculpe meus amigos se algum eu ofendi

Rei Da Capa
La pras bandas de Barretos na maior zona de gado
Foi berço de criação de peões afamados
O Petico e Gomercindo, Zé Pretinho e Colorado
Quatro heróis do arreio pelo povo consagrado
E foi neste mesmo mapa
Que nasceu o rei da capa campeão de dois estados, ai

O Turquinho e um toureiro de talento e suporte
O seu nome conhecido desde o sul até o norte
Para sair vitorioso nunca dependeu da sorte
Era um caboclo de confiança destemido e muito forte
Pra lutar com boi selvagem
É um peão de coragem que não teme a própria morte

Nasceu em Jaborandi o mundo guiou seus passos
Abandonou os estudos pela inclinação do laço
Nessa lida tão pesada nunca encontrou fracasso
Enfrenta qualquer perigo com muito desembaraço
Sem mostrar muito serviço
Ele faz qualquer mestiço ficar preso nos seus braços

No estado de São Paulo teve pouco paradeiro
Atravessou a montanhas do grande estado mineiro
De cidade em cidade orientava os companheiros
Demonstrando seu valor de campeão dos picadeiros
O Turquinho é um homem
Que sabe honrar o nome de paulista e Boiadeiro

Minha Resposta
Ontem mesmo tive lendo aquela sua cartinha
Depois que lia a carta dobrou a alegria minha
Eu fiquei mesmo pensado no que você me escreveu
Mas agora é muito tarde meu coração te esqueceu

Você já foi castigada e os seus planos de desfez
Agora vive implorando pra mim voltar outra vez
Mas esqueça, por favor, esse amor que já foi seu
Eu agora sou de outra pra mim você já morreu

Me pagaste com desprezo que fiz pra lhe servir
Até mesmo pouco caso de você eu recebi
Mas agora é o contrário um favor vou lhe pedir
Não fale mais do meu nome que do teu eu já esqueci

Eu hoje vivo alegre não tenho mais sofrimento
E nem lembro se quer de você um só momento
Minha vida transformou meu viver é sossegado
E melhor viver sozinho do mal acompanhado

Boiadeiro Punho De Aço
Me criei em Araçatuba
Lançando potro, dando repasso
Meu velho pai pra lidar com boi
Desde de menino guiou meu passos!
Meu filho o mundo é uma estrada
Cheia de atalho, tanto embaraço
Mas se você for bom no cipó
Na vida nunca encontra fracasso

Com vinte anos eu parti
Foi na comitiva de um tal Inácio
Senti um nó me aperta a garganta
Quando meu pai me deu um abraço
Meu filho Deus lhe acompanha
São estes os votos que eu te faço
E como prêmio do seu talento
Lhe presenteio com este meu laço

Por este mundo afora
Fiz como faz a nuvem no espaço
Viajando ao leu conhecendo terra
Sempre ganhando dinheiro aos maços
Meu cipó em três rodilhas
Cobria a nuca do meu picaço
Foi o que me garantiu o nome
De boiadeiro punho de aço

De volta pra minha terra
Viajava a noite com o mormaço
Naquilo eu topei com uma boiada
Cortando o rio vinha passo a passo
E um grito de um boiadeiro
Pedindo ajuda cortou espaço
Eu vendo o peão que ia rodando
Saltei no rio com o meu picaço

A correnteza era forte
Tirei o cipó da chincha do macho
E pelo escuro ainda consegui
Laçar o peão por um dos seus braços
Ao trazer ela pra praia
Meu coração se fez em pedaços
Por um milagre que Deus mandou
Salvei meu pai com seu próprio laço

Arrependimento
Morena eu vou responder a carta que você escreveu
Dizendo que fui culpado de tudo que aconteceu
Mas quero esclarecer o erro de onde nasceu
Você deve estar ciente desse mal que cometeu, ai

Quando eu encontrei na rua nem a mão você me deu
Passando ao lado de outro fez que não me conheceu
Embora fosse colega ou algum parente seu
Não devia proceder conforme tu procedeu, ai

Também já fiquei sabendo que você não me esqueceu
Pensava em me judiar, mas logo se arrependeu
E agora só o que resta é ouvir o conselho meu
Procure esquecer o amor que um dia a gente perdeu, ai

Não guardo o menor rancor do procedimento seu
Me orgulho de assim dizer que você me pertenceu
Hoje não pertence mais, nosso tempo já venceu
Mas quero que tu compreendas que o errado não fui eu, ai

Músicas do álbum Raízes (PHONODISC 79186) - (1980)

Nome Compositor Ritmo
Rosa Traiçoeira Lauripes Pedroso / Teddy Vieira Toada
Mineira De Uberaba Zé Da Estrada / Paiozinho Cateretê
Preto De Alma Branca Lauripes Pedroso / Teddy Vieira Moda De Viola
Falsidade Zé Capoeira / Douradense Cateretê
João De Barro Teddy Vieira / Moybo Cury Toada
Triste Romance Benedito Seviero / Dino Franco / Geraldina Rodrigues Moda De Viola
Boiada Zé Paioça Toada
Resposta Roque De Almeida / Ado Benatti / Compasdre Juvenal Cateretê
Rei Da Capa Benedito Seviero / Dino Franco Moda De Viola
Minha Resposta Biguá / Boroti Cateretê
Boiadeiro Punho De Aço Teddy Vieira / Pereira Moda De Viola
Arrependimento Benedito Seviero / Luiz Vieira Moda De Viola
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